Pescoço de girafa, maria macho, monstrinho, bolacha, pé de pato, cara de cavalo, perna de seriema, galo de briga, focinho de porco, nariz de tomada, macaco, rato, lula, baixinho, gigante, tampa de caixão, boi preto, capeta, fedorento, cambota, florzinha... Pensa que acabou?
E quem já tem nome ou sobrenome sugestivamente propício então? Pinto, Rego, Rosa, Coelho, Lobo, ex-presidente da CEF Cutolo, ministro da fazenda Mantega, Lucas/Loucas, Aurélio/orelha, senador Suplicy/suplício.
Ninguém escapa e até se poderia encher muitas páginas com esses “carinhosos” apelidos que recebemos durante a vida, sejam de amigos, inimigos, parentes, desconhecidos, colegas de trabalho, professores...
Mas, importante frisar, não se tratam de simples apelidos e brincadeiras de crianças. Se neste exato momento e não por acaso, estes vitupérios (atos de exprobrar, condenar ou repreender, desprezar; ignomínia, insulto, injúria, agravo, ofensa, ultraje, infâmia) emergiram do subsolo da sua memória sensações de ansiedade, medo, raiva, pavor e pânico é sinal que, muito provavelmente, tenha presenciado tal agressão ou mesmo sido vítima do “booling” ou “bullyng”.
“Booling” é uma expressão da língua inglesa, aparentemente sem tradução, mas são consideradas como ações de chacotas, piadinhas e agressões entre os indivíduos. Conceitualmente, o ato se caracteriza quando uma pessoa ataca moralmente e/ou fisicamente a outra com freqüência. O fato levanta preocupação nos pesquisadores e estudiosos, especialmente, da pedagogia e psicologia, pois podem influenciar na formação e personalidade da pessoa “boolinada” para o resto da vida.
Para a advogada, socióloga e professora Isabel C. S. Vargas, “bullyng” pode nos parecer uma palavra estranha, mas ao tomarmos conhecimento do seu significado e como se processa, estaremos diante de algo já conhecido. O seu significado vem do inglês e quer dizer amedrontar.
Referem-se a atitudes sistemáticas, repetitivas e ameaçadoras que se processam fisicamente e, ou, verbalmente podendo, inclusive, impedir o desenvolvimento físico e emocional saudável das pessoas.
Há casos graves de crianças vítimas, que tiveram de trocar de escola e até mesmo de residência por não aguentarem as pressões sobre elas. Também, já foram registrados até mesmo suicídios decorrentes disso.
Na busca pela liderança de um grupo, simples prazer de saber que o alvo será atingido, ou pela necessidade de neutralizar quem o predispõe a eventuais riscos o agressor do “booling” busca identificar nas suas vítimas características físicas, intelectuais e de comportamento, que as diferem da maioria.
Estes traços são cruelmente amplificados pelo intermédio do escárnio, violência, inconsequência e, por que não dizer, por pitadas indesejadas de maldade; verdadeiras maledicências que podem paralisar personalidades criativas para o resto da vida, prejudicando inclusive o desenvolvimento sócio-pedagógico de estudantes.
Pronto! A ovelha está isolada, agora é só atacar! Dispare seus letais e nojentos adjetivos, torturante e silenciosamente ou alardeado pelos quatro ventos do sarcasmo e desdém. Seja perverso, repita e reafirme mais e mais... Ganhou! Conseguiu excluir, afugentar e isolar alguém.
Acompanhe essa Reportagem:
Alunos sofrem agressões e humilhações de colegas e professores.Um menino de nove anos foi agredido por colegas porque é gago.Tal comportamento é conhecido como bulling.Uma pesquisa da Unicamp mostra que as humilhações também partem de quem deveria dar o exemplo.
Helen Sacconi - Campinas, SP
A família do menino ainda não se conforma com o que aconteceu. O estudante de nove anos teve alta do hospital no fim de semana depois de passar por vários exames que diagnosticaram uma lesão no pescoço.
Ele foi vítima de cinco colegas. A família conta que o garoto já havia sido agredido outras vezes pelo mesmo motivo, porque é gago.
“A professora diz que ele nem conversa dentro da sala de aula. Ele tem medo de tentar falar alguma coisa e eles tirarem sarro dele”, afirma a mãe.
Especialistas da Universidade Estadual de Campinas buscaram entre alunos de escolas públicas e particulares respostas para esse comportamento humilhante que ficou conhecido pela expressão inglesa "bulling".
Mas depois de quatro anos de pesquisa eles constataram: em muitos casos quem deveria educar, muitas vezes incentiva a agressividade. Quase a metade entrevistados alegou sofrer humilhações constantes por parte dos professores.
"Fala com o dedo na nossa cara e fica gritando muito alto", conta um aluno.
"Exatamente esse dado nos surpreendeu. Ações que nós podemos dizer que são violências físicas e muitas vezes até morais", comenta Luciene Paulino Tognetta, professora Faculdade de Educação da Unicamp.
Foi assim com um adolescente que não quer se identificar. Ele reclama da forma como é tratado pelos professores.
"Quando tem gente conversando e eles não querem conversa, eles gritam, batem livro na mesa, joga apagador, joga giz. Xinga a gente de idiota, burro, macaco", conta outro aluno.
A mãe dele conta que foi orientada pelos coordenadores a bater no filho para que ele se comportasse.
"Tirar o videogame, bater tomar uma atitude firme com ele, tanto verbal quanto física, pra que ele mudasse a sua atitude dentro da sala de aula", declara a mãe.
Para uma educadora da Unicamp situações como essas são provocadas pela falta estrutura de trabalho enfrentada pelos professores e pela falta de limites dos alunos.
"Professores e alunos se entendem muitas vezes, cada vez menos e estão todos descontentes”, afirma Angela Soligo, educadora da Unicamp.
A educadora da Unicamp também disse que os pais não aceitam bem as críticas em relação aos filhos. E que os estudantes não estão preparados para a frustração.
Fotes:Casa e Cidadania,http://www.casacidadaniaediversidade.org.br/iccdodecasamag.htm
Jornal Hoje, edição do dia 21/09/2009